Sobre a Tal de “Felicidade Plena” ou Meu Sonho

Posted by Allan Andreas | Posted on 14:33

0

Foto: de Calvin fazendo Caretas.


Não concordo com a idéia de plena felicidade, de estar totalmente realizado, pois como ser humano carrego a maldição de nunca estar satisfeito por inteiro, pois o ser como um todo de corpo e intelecto sempre tem “sede” de mais, de tudo.


Contudo á pessoas que se dizem feliz por completo, porem dizem sonhar também, contradição um tanto que “gritante”, pois, em minha opinião, o sonho é a prova mais abstrata e concreta (adoro a beleza da contradição) da in-contentação da vida que levamos, pois sonhar é escapar de tudo o que lhe desagrada é uma utopia.


“Felicidade plena”, nada mais é do que á metamorfose do sonho, no teatro da vida não é a felicidade que faz plano de fundo pro tempo passar, é a tristeza que corre ao fundo lhe acompanhando, a felicidade é o desgaste dessa tristeza, são pequenos furos ou rasgos no plano de fundo da vida, que com o tempo se coroe, ¹“A hora do sim é o descuido do não”.


Por tanto só acredito em felicidade em ²Pasárgada, pois lá sim ²“sou amigo do rei, lá tenho a mulher que quero na cama que escolherei”, por isso ²“Vou me embora pra Pasárgada”. (ou meu sonho).





¹ Fragmento da musica “Sei lá” de Vinicius de Moraes.


² Fragmentos do poema “Vou-me Embora Pra Pasárgada” de Manuel Bandeira, in Estrela da Vida Inteira, Editora Record.


Deixa pra lá ou "Retrato de uma vida sem Sentido"

Posted by Allan Andreas | Posted on 16:26

1



DEIXA PRA LÁ


Ou


Retrato de uma vida sem Sentido



Dedicado a Flavio Mello



Deitei-me as quatro da manhã, fazendo aquilo o que sempre faço, escrevendo, fumando e tomando café, normalmente isso tudo sozinho.


Ecoa em cada canto mofado de minha casa um silêncio irritante, perturbador, mas ao mesmo tempo consolador de minhas agonias, dos sonhos reprimidos.


Sonhos pra mim é luxo, é que raramente os tenho, se é que de fato os tenho, falo de sonhos mesmo daqueles que se tem em quanto se dorme, e não de projetos premeditados que nunca se realizam.


São quatro e meia, sei que em algum momento tenho que ir dormir, mas é tão vazio, não me lembro de absolutamente nada, deito-me fecho os olhos e (o que me parece ser poucos minutos depois) o maldito despertador dispara, feito uma criança ensandecida, um barulho irritante, ai está outra coisa da qual eu deveria me livrar, o maldito despertador. Meu sono parece curto e escasso. Estou sempre cansado e pra baixo. Alguns poucos amigos dizem que isso é falta de sonhar, ainda não entendo o porquê de me dizerem isso, afinal (pelo que sei) sonho é ilusão. Então, quer dizer que, não posso ser feliz por não permitir ser iludido?


A rotina me consome me explora, me destrói pouco a pouco, é estranho mesmo tendo a consciência desse mal continuo dependente dessa droga, desse vicio, e rotineiramente simplesmente vivo o script. Cada dia é como um ensaio e os ensaios se aperfeiçoam, até o dia do espetáculo final, que imagino ser a morte ou algo banalmente igual.


Sei lá, o sentido de tudo o que faço, também não sei o mistério do bem e do mal, na verdade – que se foda o mistério do bem e do mal.


Saio às sextas-feiras e me divirto do meu jeito, café, livro, mulheres, conversas, sexo, amigos e bebidas. Não me importo com a direção que o meu futuro toma. A verdade é que independentemente da estrada que tomarmos todos nós, isso inclui você e eu, nos encontraremos no final. Juntos em uma cova de sete palmos (isso se o coveiro não estiver cansado e não resolver economizar uns palmos, no ato de seu filosófico ofício).


Quem sabe eu pense tudo isso por pura inveja (só por que não sonho), só por que não posso voar não posso me deitar com a mulher que amo, ter a filha que sonho, ser feliz de todo coração? Talvez seja isso. Sim eu amaria, de coração inteiro, repleto de um amor complexo, destes que juram ser pra sempre. Eu até cumpriria, mas sozinho não dá, digo sozinho não porque ninguém goste de mim, sou até que amável, tolerável, mas nunca encontrei alguém que eu amasse de verdade. É, quem sabe eu seja mesmo um invejoso, um infeliz que não tem a dádiva de sonhar. Quem sabe seja eu um castigo entregue a todos por Deus. Bom se ele deu-me como um castigo que pelo menos acertasse.


Agora além de sonhar não durmo direito, bom é o que dizem: “Nem tudo é ...” deixa pra lá.


Finalmente me deito, repousado na cama da minha solidão, no quarto das minhas paixões, casamentos de dois dias. Eu até que sofri por amor, chorei, lamentei, esbravejei com os céus, sofri uma vida inteira, tudo em um único dia. Fiz de um ano uma semana. Os olhos se fecham. E na mesma sensação se abrem estranhos, dessa vez o despertador esta calado, levanto-me vou até a porta da cozinha que dá pro corredor, o dia está nublado, cinza e molhado. Ao virar a cabeça para direita me deparo com uma figura linda, uma mulher, um anjo, uma bailarina que divaga por meus olhos, rodopia em meus pensamentos, não consigo falar, ela me olha com seu olhar de menina, mas não um olhar superficial, olha minha alma. Dá um sorriso misterioso e sombrio, vira-se e sai, a porta bate detrás dela.


Recuperando-me do êxtase ponho-me a subir as escadas, a perseguir a amada que mal conheço, mas que desejo, ao abrir a porta escuto o barulho que rompe o silêncio como rajadas no ar, o familiar som do maldito despertador, desperto.


Hoje sai do script, estou mais irritado, mais injuriado e desolado do que nos dias normais, hoje quebrei a rotina, descobri uma coisa nova, aquilo que todos têm e que deus havia me confinado a não ter (me castigado), fico a pensar se foi mesmo castigo ou foi um presente, bom acho que foi ... ah, deixa pra lá.





Allan Andreas



Madrugada de 28/12/2009

É o que me Resta

Posted by Allan Andreas | Posted on 18:40

1

Foto de Flavio Mello
Texto Publicado no Livro:
"Jardim Santo André, ontem e hoje"
da editora Espaço Idea.


Cadê o meu café, onde estão os meus remédios para pressão, porque não se respeita mais um velho? Maldito leite! Me parece que o tempo passou e todos ficaram loucos, não tem respeito, não escutam conselhos, não pensam antes de agir, mas destroem antes de pensar. É por isso que um velho, como eu, não tem mais lugar nesse bairro, nessa cidade, nesse mundo.

O que me resta é colher as lembranças que tenho, e me distrair sozinho nesta cama, odeio ficar sozinho (na cama), mas como velhos debilitados não questionam, faço meu papel e fico quieto.

Ontem, fui até o ponto final para pegar água no caminhão pipa, o bairro ainda tá começando a consumir as lacunas esverdeadas de árvores e gramado rasteiro, por enquanto água na torneira nem pensar. Dizem por ai que o mutirão sai esse ano e tudo melhorará cada qual com seu espaço e cada espaço com seu invasor. O bairro se ergueu entre antigas fazendas pelo menos é o que sussurram nas vielas. Sei lá eu, que fazenda ou que dono... Só sei que marquei meu espaço e daqui não saio, e se me tirarem invado o do lado, e a vida cai de uma casa ilegal para outra.

O mutirão subiu, o bairro cresceu, a água chegou, evolução será? Com tudo veio à diversão, é baile! O caminho pra Mauá é longo, é barro, e escuro, mas vale o esforço, dizem que o baile de Mauá é descolado.

O tempo é a única coisa da qual não fugimos, ele traz mudanças boas e más, apesar de que tudo no mundo nos leva às coisas boas que resultam muitas vezes em coisas más, – quer um exemplo, arrumei uma namorada, linda dezesseis anos, uma vida pela frente. Namoro resulta em beijo, que resulta em intimidade e que resulta em sexo, isso foi à parte boa, porém às vezes sexo resulta em gravidez, essa parte é a ruim.

Eu tinha dezoito ela dezesseis, a vida parou, trabalho era prioridade. Quando se trabalha desesperadamente nem se vê o tempo passar, mas o tempo lhe engole. Tudo aqui mudou os comércios tomaram conta do lugar, assim como as invasões, ainda mais com essa história de indenização da prefeitura. O transporte coletivo cresceu, tem até escola particular, o concreto tomou conta do verde, assim como manda uma boa evolução.

Com isso aumentou a diferença social, pobreza à mostra, violência é só conseqüência, medo de andar nas noites, baile nem pensar, vai ficar só na memória, principalmente por que tenho um filho. Os filhos crescem, com o meu não foi diferente, dei boa educação, oportunidade de estudo, aqui mesmo no colégio particular do bairro, e sempre pensei, – quando eu ficar velho esse menino cuida de mim.

Como acabo de dizer, pensei, hoje é meu último dia nesse bairro, vou para um asilo, não por vontade própria, meu filho arrumou uma noivinha, eu incomodo, por isso me colocou pra fora.

Sentirei saudades desse bairro, foram tempos difíceis, mas vi o bairro crescer, assim como um filho, claro que ainda não está totalmente formado, eu diria que é um jovem com vontade de crescer, foram lágrimas e risadas, tenho certeza que minha mulher também acharia isso, que Deus a tenha.

É, o carro do asilo chegou, parece que é hora de me despedir, vou sentir falta mesmo é da brisa da tarde que sopra lá do Morro do Cruzeiro, vou ter que me acostumar com o cheiro de mofo do asilo, é o que me resta.

Biografia de uma Lagrima

Posted by Allan Andreas | Posted on 11:57

4




Nasce na esfera ocular dissoluta uma lágrima.
Escorre a nua face gélida da personificação do abandono;
Afoita desliza aos lábios da criadora;
Se exalta, ao longo beijo e único da mocidade.
Desprende-se dos prazeres, faz a curva sinuosa ao queixo.
Para, como se já soube-se o destino que a espera;
(Na verdade sabe, todos sabemos.)
Desfruta do odor de rosas que se desprende da pele;
Embriagada caminha ao abismo.
Para, e salta.
Ao chão, agora estilhaçada, evapora ao ciclo da vida.
Os vapores sobem aos céus, e a tristeza encharca o sepulcro.

Allan Andreas

Fragmento Social

Posted by Allan Andreas | Posted on 18:08

0

Nada ouvi;
O estilhaço da sociedade estoura de fronte á minha face.
Nada senti;
Estagnado, esmagou-me a carne e estraçalhou meus ossos um a um;
O agonizante choro da criança faminta, no regaço da triste mãe .
Atento á sociedade não é só este que chora;
Há outro que derrama o pranto baixinho, é o menino Brasil que lamenta.

Allan Andreas